Na tarde calma de um domingo de Páscoa, sonhei que alguém me chamava do lado de fora da casa.
Não era um grito, nem um sussurro — era um chamado. Simples assim.
Como se o meu nome tivesse sido dito pela própria brisa.
Levantei-me do leito com o corpo ainda leve de sono e os pés quase sem peso. A casa estava silenciosa, como se o tempo houvesse parado dentro dela. Abrí a porta. Do lado de fora, o mundo seguia em seu como: uma luz difusa iluminava o gramado, a brisa eava entre as folhas, e nenhuma alma à vista.
Mas havia algo.
Ali, no gramado úmido de orvalho tardio, estavam duas cadelas deitadas.
Uma preta e branca, outra toda branca. E ao redor delas — como se brotados da terra — uma quantidade de filhotes que eu não podia contar. Pequenos, sedentos, em movimento constante, como as ondas suaves de um mar de leite e vida.
As mães estavam serenas, sem latidos, sem alarde. Apenas ali, dando de si sem pedir nada.
Ficou parado, observando. Senti que havia entrado num lugar sagrado.
Não era sonho… ou era?
Não havia palavras. Apenas a certeza de que presenciava um mistério.
Ali, no centro do mundo, duas mães alimentavam o futuro.
Não guerreavam, não competiam, não fugiam.
Apenas permaneciam, em silêncio e entrega.
Quando acordei, o quarto estava mergulhado em luz suave.
Não ouvi mais chamados.
Mas dentro de mim, o silêncio do gramado seguia vivo.
Desde então, nunca mais ouvi meu próprio nome com os mesmos ouvidos.
Porque às vezes, o chamado que nos acorda não é para ver algo,
mas para lembrar.