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Aprender não é treinar: É transformar 351b2i

*Por Tatiana Finamore

Uma cultura de aprendizagem sólida vai muito além da oferta de treinamentos. Ela se manifesta quando aprender se torna parte natural do dia a dia, valorizada por líderes e colaboradores, e diretamente conectada ao desempenho organizacional. É um ambiente onde curiosidade, experimentação, troca de conhecimento e melhoria contínua são incentivadas — e, mais do que isso, recompensadas.

Diante disso, talvez seja hora de revisitar os conceitos que temos sobre aprendizagem. O modelo tradicional ainda predomina: trilhas de desenvolvimento estruturadas, com curadoria de conteúdos e caminhos previamente definidos. Embora isso possa ser útil diante do volume de informação que recebemos diariamente, precisamos questionar: onde está o protagonismo do aprendiz nesse processo?

Quando o caminho já vem traçado, o profissional tende a assumir uma postura iva. Isso compromete o desenvolvimento da autonomia, da confiança e, muitas vezes, perpetua a lógica do “comando e controle” nas empresas — o que pouco contribui para uma aprendizagem genuína. Quantos treinamentos ainda geram pouco ou nenhum retorno real? Qual é o índice de evasão e ausência nos programas da sua empresa?

Permitir que o colaborador assuma o papel de aprendiz ativo e desenhe sua própria jornada de desenvolvimento exige coragem — e, sim, um certo grau de maturidade organizacional. Mas é também um movimento necessário, sobretudo porque acredito que a responsabilidade pela própria carreira é indelegável.

Como bem disse Conrado Schlochauer (ativista da aprendizagem): “Contaminamos o prazer de aprender com a obrigação de ser ensinado.” Não temos controle sobre todas as variáveis que cercam o processo de aprendizagem — e talvez esse romantismo precise mesmo ser desconstruído. Em vez disso, podemos assumir o risco (calculado) de promover um verdadeiro ecossistema de educação. O presente — e não mais o futuro — já exige contextos mais colaborativos. E isso se conecta diretamente à necessidade de adaptar os programas de desenvolvimento a diferentes gerações, com perfis e expectativas diversas.

Por isso, não podemos mais restringir o conhecimento a uma trilha ou a uma figura central. O saber é dinâmico e se constrói nas conexões — entre pessoas, experiências e metodologias. Defendo que a melhor formação é aquela que, em tempo real, desperta um insight, provoca reflexão ou impulsiona uma mudança de comportamento.

Informação e conhecimento (tácito e explícito) são ativos corporativos valiosos. Quando entendemos conhecimento como o resultado da combinação entre experiência e informação, fortalecemos a gestão do conhecimento como um campo multidisciplinar essencial para a aprendizagem organizacional.

Toda empresa tem uma cultura de aprendizagem — a questão é se ela está sendo intencionalmente cultivada ou não. Pequenas mudanças no contexto podem gerar grandes transformações. Criar redes de mentores ou multiplicadores, por exemplo, é uma forma poderosa de engajar lideranças e torná-las embaixadoras da educação corporativa.

Precisamos ressignificar as oportunidades de aprendizagem, tornando-as mais orgânicas, conectadas e relevantes. Quando aprender se torna um hábito — e não uma obrigação — a cultura se transforma. Um bom exemplo disso é o microlearning, com pílulas curtas de conteúdo inseridas em momentos estratégicos do dia a dia. Esse formato reforça o aprendizado de forma leve e prática, favorecendo a retenção e aplicação imediata do conteúdo. O peer learning, por sua vez, promove a aprendizagem horizontal: pessoas ensinam e aprendem juntas, em ciclos de troca genuína.

Com isso, as ações de aprendizagem ganham verdadeiro significado. Elas am a melhorar a forma como vivemos, nos relacionamos e — como consequência, e não ponto de partida — como performamos. É por meio da experiência, e até mesmo do erro, que o conhecimento teórico a a ter sentido, utilidade e poder de transformação.

Apesar de todo o discurso sobre educação para adultos, ainda reproduzimos, muitas vezes, modelos escolares dentro das empresas. O estímulo-resposta de Skinner, lá da década de 50, ainda aparece disfarçado em muitas práticas. Falamos sobre a importância das soft skills, mas nem sempre criamos espaço real para desenvolver competências transversais. E nos deixamos, frequentemente, seduzir pela tecnologia como espetáculo — quando, na verdade, ela deveria ser ponte, não distração. Só quando aplicada com intencionalidade didática e alinhada ao contexto, a tecnologia se torna de fato um recurso potente para a aprendizagem.

Mais do que gerar e transmitir conhecimento, precisamos criar experiências de aprendizagem memoráveis — aquelas que se conectam com o cotidiano, despertam sentido e impulsionam o crescimento real. Nesse caminho, o papel do RH é fundamental: curar, facilitar, influenciar e fomentar uma cultura de aprendizagem conectada tanto ao negócio quanto às pessoas. Ao lado da liderança, o RH deve garantir que o desenvolvimento deixe de ser um projeto paralelo e e a ser parte da estratégia. Porque, no fim das contas, não se trata apenas de formar.
É sobre transformar.

*Embaixadora da ABRH-MG em Juiz de Fora

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